Minha identidade não tem carácter temporário, mas sementes de eternidade! (Moysés Azevedo)
Alguém a quem muito estimo escreveu: 'se vires a mim, vagando por aí, peça para eu voltar, diga que estou esperando.'
Como é bom saber que se de mim eu me perder, tenho para onde voltar, tenho raiz, e melhor ainda terei alguém a me mostrar onde eu vou estar. Em cada retorno: um rabisco, uma inspiração, um poema, uma canção... folhas, flores ou frutos, que surge ao querer da estação...
A ela me disponho! Com ela eu vou! Nas raízes da alma, a verdade de quem sou!

Heróis, sonhos e esperanças

I

Porque os heróis me fascinam tanto? O que há neles de tão mágico?
Existe neles uma linha tênue do fabuloso ao excêntrico, do místico ao perigo, da fraqueza a grandeza, onde para alguns, fantasias vãs que nada acrescentam a realidade, mas para outros a revelação de infinitas possibilidades.

Mais que mera ficção, catarse!
Física da alma em sonho e realidade.
Basta apenas a mera ficção para deixar no coração aquela tensão positiva de expectativa pelo transcendente, pelo enervar-se ao sobrenatural.

Das ruas ao noticiário, nas esquinas e até nas prateleiras de lojas e supermercados, reais ou imaginários, nas prisões ou no confessionário, é reconfortante saber que nas diversas partes do globo não nos faltará grandes homens, estando sempre dispostos a atravessar o ‘Moon River, wider than a mile...’[1] Porque ainda que enfraquecidos, debilitados ou abatidos existe neles ‘aquela força estranha’[2] que os faz notar que há uma ‘humanidade para salvar’, permeando tudo de sentido, recordando ‘o porque’ da labuta.

Se existe um Supremo-Bem, por este, como disse um pequeno hobbit[3], vale a pena lutar, é a única coisa na qual se pode agarrar-se, não parando nos desafios, fazendo a dolorosa páscoa do mito para a realidade, do sonho para a beatitude, sendo assim mais tolerante consigo mesmo e com o outro e por isso, em verdade e caridade profundamente homem e inevitavelmente mais herói.

Estamos neste mundo e muitos de nós queremos apenas uma coisa: ser salvos! Por isso o homem tem necessidade de heróis. Eles nos devolvem os sonhos e esperanças que perdemos pela árdua estrada nos trazendo de volta a nós mesmos. Talvez esta seja a maior missão de todo super-herói: devolver-nos aos nossos sonhos perdidos. 


E quando perdemos nossos sonhos? 

O que houve com a criança destemida de outrora, aquela que aventurava a vida e brincando de herói fazia da infância palco de conquistas? É uma pena se ela cresceu e distanciando-se de sua infância abandonou lá os heróis e a capacidade de sonhar...

Será que já nos tornamos o que queríamos ser quando crescer? Saudosa inocência da ‘terra do nunca’[4] onde a alma nunca era pequena e a capacidade de sonhar imensa e intensa...

II

Em todas as épocas e lugares, em todas as raças e classes, a capacidade de ficar absorto no alvo a ser conquistado é intrínseca da alma humana. Deixar de sonhar é escolher morrer aos poucos negando aquilo que somos por natureza. Os sonhos trazem vitalidade à alma! Só a nós foi reservada a felicidade de sonhar! Sonhos a conquistar nos caracterizam enquanto homens, nem dormindo somos privados desta dádiva. É o corpo que dorme e a alma que vela! Se após esta vida não há mais nada a alcançar então não há porque sonhar, pois os sonhos são como uma escola que nos ensina sobre nosso verdadeiro lar...

E se ‘os tigres vem à noite e despedaçam nossos sonhos com suas vozes suaves como um trovão’[5] dar créditos as vozes de nossos heróis, cura as feridas da alma, nos tornamos com eles heróis de nós mesmos. Há quem diga[6] que ‘não são os sonhos não alcançados que nos destroem, e sim aqueles que não ousamos sonhar!’ Não há nada mais infeliz que ignorar os próprios sonhos! Como um câncer esta atitude nos destrói a partir de dentro, avilta a virtude, o entusiasmo e a paixão, envenena o coração.


III

Há quem não ouse sonhar porque não estar disposto a esperar. 
Não estar disposto a esta bem dita paga: ‘convém que custe caro aquilo que muito vale’[7]Entretanto, é esta espera que enobrece o sonho, por ela podemos medir o quanto vale aquilo que queremos. Para alguns voltar a sonhar, é voltar a esperar, é não temer sofrer a espera pelo objeto de nosso desejo e acreditar que entrementes, a ausência purifica nosso desejo, prova nosso querer e tendo nossos sonhos provados e purificados viveremos a bem-aventurança de gozar antecipadamente do bem que ainda não está em nossas mãos, mas que já é sonho alcançado ainda que não realizado. A espera nos livra do imediatismo moderno que longe de nos favorecer, nos lança no desespero do ‘aqui e agora’ reduzindo nossa existência a matéria e tão somente a ela. 

A espera preserva nossa alma. 
Se ‘sonhar não custa nada[8], talvez seja por isso que ao desistir de muitos sonhos, acabamos por vendê-los, sem o saber, por uma bagatela. A espera é a etiqueta com o preço de nossos sonhos e o amor a moeda de seu resgate. Desistir de esperar não é simplesmente desistir de sonhar, é aquiescer que as exigências e sacrifícios talvez não nos valha a gratuidade do sonho.

Quanto mais sonhado mais enraizado estará o sonho em nós e quanto mais enraizado mais firme ele estará na espera de seu cumprimento. Esmorecer nesta etapa seria como nadar, nadar e morrer na praia ou lutar, lutar e desistir no ultimo instante. A questão é que nunca sabemos quando será o último instante e a possibilidade de que a parte do caminho que falta a ser trilhada é equivalente ou maior ao que já foi percorrido nos assusta. 
E se eu pensasse menos e sonhasse mais, dando vazão as ideias que estão em silêncio dentro de mim? Com certeza perceberia que ainda é tempo de sonhar e longe de ser um contratempo, o tempo é colaborador dos sonhos que estão enterrados na consciência. 

IV

Há instantes em que nos perdemos, deixamos de carregar o suave julgo de nossas aspirações para carregar o fardo de cegos olhares que 
questionam o porque de nossas intenções. 'Para que tudo isto?', 'Saia do mundo da lua!', 'Você pensa grande demais!', 'Seja mais realista!', poemas sem rimas, canções que soam dissonantes em tons de cinzas descolorindo o céu de nossa imaginação. Propósitos partidos, sonhos quebrados. Existência comprometida! E é assim, ouvindo as vozes de mercadores e salteadores que nos distanciamos de nós mesmos, para longe do propósito de nossa existência, do dever de ser quem devemos ser.

Sonhos não morrem, ficam a deriva como barcos abandonados na consciência...

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[1] Moon River, composição de Johnny Mercer e Henry Mancini, interpretada no filme 'Breakfast at Tiffany's' por Audrey Hepburn.
[2] Força Estranha, composição de Caetano Veloso.
[3] Referência a Samwise Gamgee, personagem do escritor britânico J.R.R. Tolkien na trilogia 'O Senhor dos Anéis'. 
[4] Terra do Nunca, ilha fictícia do livro Peter Pan do escritor escocês J.M. Barrie onde as crianças não crescem.
[5] I dreamed a dream, canção interpretada pela personagem Fantine no musical 'Os miseráveis', baseada no livro do escritor francês Vitor Hugo. Composição de Alain Boubliu.
[6] Will Shuster, personagem do ator Mathew Morrison no seriado norte-amricano 'Glee'.
[7]  Ávila, Sta Teresa. Doutora da Igreja.
[8] Sonhar não custa nada, samba Enredo 1992 G.R.E.S Mocidade Independente de Padre Miguel

5 comentários:

  1. Dedico este texto à Greice Carvalho, Giovanna Lima, Julia Barbosa e Alex de Carvalho.
    Canção Moon River:
    http://www.youtube.com/watch?v=FCIQWV5B7Cs

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  2. "Obrigada Erlison Galvão por sua vida partilhada que hj marca a minha história com lagrimas de um recomeço em minha vida nesse tempo tão importante...
    Se ser um bom dicipulo e reclinar no peito do Mestre a escutar, então é ali que quero estar no coração que hoje marca o meu coração com a Etiqueta da Esperança, voltar a esperar? SIM! Pois nunca mais quero deixar de Sonhar..."

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  3. Ave Maria... que demais!T|ô passando mal com esse texto!

    Louvo a Deus pelo dom da sua vida...por poder encontrá-Lo em tantas manifestações artísticas que emanam da tua alma...tão maleável à Vontade d'Ele...

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  4. Este comentário foi removido pelo autor.

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    1. Texto que nos leva a sonhar, obrigado por partilhar uma dádiva de Deus para nós, mas que as vezes enterramos por nossos medos e inseguranças.

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